- Então é Natal, certo?
Ele
colocou a comida na mesa. Não escutava nada, porque estava com os fones de
ouvido. Contou os assentos e pegou os talheres e os pratos.
- Então
é Natal! – suspirou.
- Foi o
que eu acabei de falar.
Seu
olhar estava distante, mirando fixamente em um ponto específico.
- O
quadro está torto...
Não se
moveu. Seus pés doíam, suas pernas estalavam de cansaço e seus braços não agüentariam
fazer mais força. Ficou assim, como estava. Imóvel. Ninguém se importaria. A
comida iria acabar e ele ainda estaria com fome.
- Você
está bem?
- Você
é um idiota!
Virou-se,
bruscamente. Puxou a toalha de mesa e ouviu o barulho ensurdecedor de pratos,
taças, tigelas e porcelanas quebrando. Abaixou-se e jogou pedaços do peru na
parede. O marido, ainda mais branco, estava perplexo. Não ousava se mexer. Tão
previsível.
- Você
é um idiota!
Pegou
os pedaços da melancia e saiu, batendo a porta ao passar. Devorou, um a um,
enquanto andava apressado pela rua iluminada pelas luzes de pisca-pisca. Bateu
na porta de uma casa vizinha a sua e foi atendido por um homem alto, moreno,
cabelo curto e encaracolado, peito peludo e um sorriso encantador. Não esperou
ser convidado. Agarrou o vizinho e o beijou, longamente, desesperadamente. Ele fechou
a porta com um pontapé e saboreou o gosto de melancia com seus lábios
experientes, acostumados a beijar aquela boca. Seus braços jogaram-no no sofá e
ele tirou sua bermuda. A visão daquele corpo moreno deixou ele sedento. Seu
olhar encontrou os olhos castanhos do vizinho e os dois sorriram,
maliciosamente.
-
Cansou do marido?
- Ele é
um idiota. Natal com ele não tem emoção.
O
vizinho sorriu. Amaram-se e comeram toda a comida. Com o outro sempre sobrava.
Deitaram um no outro e conversaram horas. Com o outro sempre acabava em sono.
-
Trouxe melancia.
- Então
é Natal, certo?
Dessa
vez ele escutou. Sorriu. Os dois se entendiam.
- Se
ficar aqui podemos dormir de conchinha.
- Eu
sei que você gosta, mas amanhã eu vou embora.
- Ok.
Eu sei que você volta.
- Eu
sempre volto.
Suspirou,
com a barriga cheia.
- Então
é Natal!
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