Copyright © Palavra-poeta
Design by Dzignine
31 de julho de 2012

Esclarecimentos

Gostaria de esclarecer algumas coisas sobre a homossexualidade:

1. Homossexuais são promíscuos. 

Os homossexuais são promíscuos. Trocam de parceiro sexual assim como trocam de roupa. Alguns até são um pouco mais, digamos, gulosos e cometem esse pecado abominoso, o sexo, com mais de um parceiro. TODOS os heterossexuais são fiéis, têm apenas um parceiro fixo, de preferência um a vida toda, não fazem sexo a três, não sabem o que é sexo oral, nunca fizeram sexo em público e fazem sexo apenas para se reproduzir, sem o intuito de ter prazer, porque é o certo, segundo a Bíblia. Depois que se reproduzem, são ótimos pais. Não há notícias de haver, entre heterossexuais, pais jogando filhos no lixo, obrigando-os a se prostituir e nem explorando-os sexualmente.  

2. Homossexuais só querem sexo, não amam. 

Exatamente. Os homossexuais são seres que pensam em sexo do começo ao fim do dia. São o oposto dos heterossexuais, que, como eu disse, são parceiros fiéis, dedicados, não traem, não olham e nem desejam os parceiros alheios. Entre os heterossexuais não há um que fique com o outro apenas com o intuito de se satisfazer sexualmente. Os casos de violência doméstica, estupro, crimes passionais e outros, sinais evidentes da falta de amor, são inexistentes entre os heterossexuais.

3. Existem vários motivos pra que a proibição do casamento aos homossexuais na maior parte do mundo continue.

Claro! Como, por exemplo... Que Deus não concorda com essa pouca vergonha! Os homossexuais vão todos para o inferno. São todos um bando de sem vergonha, sem moral, vão acabar com a estrutura familiar heterossexual, tão estruturada, baseada nos bons costumes. Os heterossexuais, sem exceção, zelam pela estrutura familiar. Discordam totalmente (e não praticam!) da prática do divórcio, violência doméstica, dos maus tratos às crianças e adolescentes.

4. A homossexualidade é uma doença. 

Que a homossexualidade é uma doença todo mundo já sabe. Mas uma coisa que quase ninguém sabe é que a homossexualidade é uma doença transmissível. Por isso os homossexuais lutam tanto contra a homossexualidade. Têm medo de que essa doença se propague rapidamente. Não vê que o número de homossexuais vêm aumentando cada vez mais? Os heterossexuais protegem particularmente seus filhos. Proíbem totalmente o beijo gay na televisão porque ver isso é tiro e queda: se torna homossexual no mesmo segundo! Mas parece que os homossexuais são imunes aos efeitos da heterossexualidade, que é também uma epidemia (mas uma epidemia boa!). Mesmo vendo seus pais, familiares e amigos heterossexuais se beijando eles não se tornam heterossexuais. Já os heterossexuais estão cada vez mais imunes. Por isso é necessário exterminar os homossexuais para que os heterossexuais menos imunes à essa terrível doença não sejam infectados.

5. Homossexualidade é uma nova moda. 

A homossexualidade é propagandeada pela mídia. O estilo marginal de vida dos homossexuais é glorificado, dignificado e isso é extremamene prejudicial às nossas crianças e adolescentes. Elas veem as notícias de homossexuais sendo mortos, espancados, humilhados e, com seu espírito masoquista juvenil, têm um desejo imenso de sair por aí sendo espancadas, humilhadas e desrespeitadas. Algumas se tornam homossexuais por terem tendências suicidas. Alguns jovens, extremamente compassivos, veem os noticiários sobre alguns direitos recém-adquiridos pelos homossexuais e abdicam-se dos direitos que têm como heterossexuais para se tornarem homossexuais marginalizados e sem os mesmos direitos.

6. E, para concluir, estudos comprovam que homossexuais não são pessoas como as outras pessoas. 

Sim, é isso mesmo que você leu. Os homossexuais não são pessoas como os heterossexuais. Pra começar, como eu já disse, eles são doentes. Mas isso já é do conhecimento universal. Mas estudos científicos comprovam que eles também têm outras "particularidades". Homossexuais têm olhos, nariz, boca, orelhas, braços, pernas, órgãos sexuais. Nascem, crescem, envelhecem, morrem. Têm cinco sentidos: visão, tato, olfato, paladar e audição. Eles pensam, comunicam-se, interagem. Isso, por si só, já mostra que eles não são pessoas como as outras pessoas. Eles não merecem os mesmo direitos que os heterossexuais, já que estes não têm essas "anormalidades".


28 de julho de 2012

Desejo sem importância


Eu quero aquele que ninguém nota,
Quero aquele por quem ninguém se importa.
Eu quero o infame, o repudiado.
Eu quero aquele que conserva a lucidez nesse mundo de loucos.
Eu quero aquele que conserva a loucura nesse mundo de lúcidos.

Eu quero aquele que me note,
Que por mim se importe.
Eu sou infame e me repudio,
Eu sou assim desde menino
Louco e lúcido.

Eu quero aquele que se conserve são após os meus delírios
Aquele que se conserve sério após meus dramas
Aquele que me ouse enfrentar.

Só ele saberá como é difícil,
Só ele saberá o quão árduo e complicado sou eu.
Quero aquele que ninguém nota
Pra que seja só meu!


"Plaza de Toros", 2005
48" X 36", acrylic on canvas

Steve Walker  

26 de julho de 2012

Feliz Dia Do Escritor (Atrasado)

Atrasado, mas acho que o que vale é a intenção.

Ontem, dia 25 de julho, foi dia do Escritor. O dia de todos aqueles que dedicam parte do seu tempo para espalhar as suas palavras para o mundo, seja através de livros, através de cartas, através de blogs. O que vale é a intenção de transmitir a emoção, o conhecimento, o seu ponto de vista, a sua impressão sobre o mundo. O que vale é a intenção de transmitir os seus sentimentos, as suas lutas, as suas vitórias.

Hoje gostaria de compartilhar contigo um pouco da vida do Jovem Poeta, para que vocês entendam um pouco mais sobre o que é a escrita para mim. Há alguns anos atrás eu era uma criança introvertida. Não que agora eu seja um adolescente extrovertido, mas pra mim era muito difícil o contato com outras pessoas. A minha timidez era muito, muito grande e escrever era um refúgio para mim. Através da escrita eu podia compartilhar os meus medos, os meus sentimentos, os meus segredos. Eu sempre mantive diários, nos quais eu escrevia sobre tudo que me afligia e também sobre todos os meus sonhos. Eu não tinha muitos amigos, não compartilhava muito as minhas coisas. Como muitos já devem ter percebido, o Jovem Poeta é um garoto que gosta de outros garotos. Isso sempre foi um peso para mim e eu rezava todos os dias para que Deus fizesse com que eu me tornasse um garoto "normal", que gostasse de garotas. Mas Deus nunca atendia o meu pedido... Eu nunca escrevia sobre essa minha aflição. Eu não ousava nem sequer tocar na palavra "gay", muito menos escrevê-la em algum papel, que alguém poderia ler.

Levou muito tempo para eu aceitar a minha orientação sexual. As minhas primeiras palavras sobre isso não foram com pessoas que eu conhecia. Eu conversava bastante com pessoas que eu conhecia pelos "bate papos" da vida e foi com elas que eu me abri. Eu fui vendo que existiam outras pessoas como eu e que algumas já não tinham mais tanto medo como eu tinha.

Resumindo a história, eu acabei me assumindo e hoje sou um garoto feliz e sadio com meu próprio eu. Acho que nunca comentei que o meu propósito, ao criar esse blog, era transmitir palavras pra todos aqueles como eu, garotos que amavam outros garotos. Os únicos sites voltados para eles eram sites pornográficos. E então eu comecei a escrever poesias de amor. Eu comecei a vivenciar o amor e começar a passá-lo para o papel. O blog é isso. As minhas palavras de superação, de amor, meu grito por igualdade.

E, hoje, eu gostaria de deixar uma mensagem para todos aqueles que escrevem: nunca desistam de suas palavras. Escrevam, compartilhem, aprimorem-se. Escrever vai muito além de apenas escrever. E quando você compartilha o que você escreve... É uma sensação indescritível. É uma sensação indescritível você ouvir as pessoas comentando sobre as coisas que você escreve. Isso, muitas vezes, é o que me move a seguir. As palavras que posso distribuir para as pessoas.


23 de julho de 2012

Segue a estrada


Aqui, no escuro da noite, o desafio é fácil.
Na luz do dia pode ser que eu tropece, mas eu irei conseguir!
Aqui, onde há tanta proteção, não costumo tremer.
Talvez, lá fora, meu corpo sofra espasmos, mas eu não vou desistir!
Aqui, onde sou tão amado, a insegurança não tem porque me assaltar.
Mas o mundo é frio e nem sempre serei acolhido,
E, mesmo assim, ainda terei a mim,
Eu vou conseguir, não irei desistir!

Porque acaba de nascer uma esperança
E ela precisa ser acesa, dia após dia
Para que não seja apagada.
Segue a sina, segue a sina,
Porque acaba de nascer uma estrada para ser seguida.


22 de julho de 2012

Será amor?


Será isso amor?
Jogar-se assim, tão nu, ao desconhecido
Sem garantias,
Entregue à sorte (ou maldição) da custódia de alguém?

Amar é esse vazio de certezas
Essa alegria assustadoramente sombria
Sem aparente razão
A não ser amar, amar, amar?

Será que é amor o que eu sinto?
O que sinto é indefinível
Mas só é bom porque é dividido
... Pela primeira vez

Amar... Toda essa mistura?
Amor, esse sentimento que ainda me assusta!
Sim, essa é a única certeza em meio ao vazio
Mas agora não fujo do que sinto.


"Romeo and Julio" 2003
acrylic on canvas, 36" X 48"
Steve Walker


20 de julho de 2012

Reviravoltas - Parte II




Ele levou um pequeno susto. Pequeno, um leve tremor. Pessoas como ele não se permitiam sentir medo, nem levar sustos. Ele estava sempre preparado para tudo. Ou fingia estar. Ele me olhou nos olhos. Eu via o arrependimento. Naquele momento, com nós dois sozinhos ele poderia pedir perdão. Mas eu não poderia permitir. Eu fui mais rápido.
- Eu te entendo, cara! Você teve que fazer aquilo. Com certeza você foi descoberto não é?
Ele assentiu, cabisbaixo.
- Eu lhe devo desculpas. Prometo que serei mais cuidadoso. Isso, claro, se você ainda me quiser...
E por que ele haveria de não querer? Eu seria o único que estaria disposto a me entregar a ele, sem ninguém saber. Eu seria o único que satisfaria os seus desejos sem atrapalhar a sua imagem, a sua “reputação”. Mas só isso não era suficiente. Ele precisava se apaixonar por mim. Desesperadamente.
Ele sorriu. Ele me queria. E, num dos becos daquela rua escura, foi o nosso primeiro beijo. O jogo havia acabado. Não havia mais uma presa que hesitaria em se entregar e não haveria um garoto idiota e romântico que esperaria se sentir seguro com ele. Mas ele, obviamente, não sabia disso. Foi carinhoso, não avançou nenhum sinal e me deu a segurança que eu não precisava mais. O seu beijo tinha um desejo reprimido, uma vontade de se entregar. Trazia a intensidade de todos os anos em que ele havia escondido o seu verdadeiro eu e todos os anos em que ele haveria de escondê-lo. Ou não...
Passamos a nos encontrar todos os dias depois da aula. Comecei a desvendá-lo, descobrir todos os seus gostos e desgostos, todos os seus interesses, todos os seus sonhos. E, o garoto popular, não era o que parecia ser. Ele também tinha um coração. “Um coração mais puro do que era o meu...”, era o que o meu coração ferido dizia, nos momentos em que eu me permitia ouvi-lo. Era tão fácil fazê-lo sorrir e mais fácil ainda deixá-lo triste. “Mais fácil ainda será fazê-lo apaixonar por mim...”. Gostávamos das mesmas músicas, nos emocionávamos com os mesmos poemas e contávamos as mesmas piadas, as que nós dois já sabíamos. Ele morava com sua avó. Os dois, sozinhos.
- Se você for lá ela nem vai reparar que...
Ele se envergonhava e não completava a frase.
- Eu não me importo. Pode falar.
E eu forçava um sorriso. Ele sentia-se acolhido. E me abraçava.
- É por isso que gosto tanto de você. Você me entende! As pessoas não entenderiam, você sabe. Qualquer dia você pode ir à minha casa. Peço para minha avó preparar uns biscoitos. O que você acha?
- Se não for incômodo...
Essa era a minha frase. “Se não for incômodo...”. Se eu não sujar a sua reputação, se eu não fizer nada pra ele ser descoberto, humilhado, feito de brinquedo como eu havia sido. E aos poucos íamos transpondo os limites. Ele, é claro, estava sendo cada vez mais imprudente. Eu sempre mostrava os riscos, mas ele insistia. Voltamos a conversar por mensagens. É claro que as minhas mensagens ficavam em uma pasta confidencial, com senha. E, obviamente, eu sabia qual era essa senha. “TurningTables”, a nossa música preferida. Reviravoltas. É... A NOSSA música!
Foi por mensagem que ele disse o primeiro “Eu te amo” e, com o tempo, eles não pararam de ser falados. Ele foi se tornando aquele garoto que eu era. Tímido, romântico e sentimental. Sorria sempre que me via, às vezes ficava me olhando, me observando e não reparava que havia outras pessoas em volta. Foi nessa época que meu coração começou a descongelar. Eu voltava a amar ele, aos poucos. “Você tem de perdoá-lo. Ele não fez por mal!”. Mas... E tudo que eu havia passado? Todos os apelidos, todas as piadas, todas as humilhações? Isso será que não valia? “Isso te deixou mais forte! E preparado para amá-lo!”.
Mas eu recusava a ouvir meu coração e meu plano estava dando cada vez mais certo. E então dei o primeiro passo para a vingança. E o seu “melhor amigo” foi o primeiro que comecei a mandar mensagens. Fui zoado por muitos dias, mas coloquei uma ideia em sua cabeça. “Tem uma pasta no celular do seu “melhor amigo” com msgs minhas ou vc acha mesmo q so eu q sou a mocinha?”. Essa mensagem foi a primeira vitória. Ele ficou interessado. “A senha eh TurningTables!”. E então ele pegou o celular e leu. Todas as mensagens. Todos os eu te amos que ele me mandava e a maioria que eu não respondia. Tudo tão devidamente calculado. As minhas mensagens monossilábicas e as mensagens que mais pareciam textos que o meu “amado” me mandava durante as madrugadas. Todas as mensagens. Das mais românticas às mais depravadas. Tudo guardado, as minhas e as dele. “Guarde as suas também, meu amor!” E ele guardou.
O seu “melhor amigo” deixou de ser após saber tudo. E a escola inteira também ficou sabendo. Meu nome já estava sujo, já havia sido fofoca por meses. Ninguém se importava com o fato de eu estar envolvido naquilo. “Não acredito! Mas eu era louca com ele. A minha amiga já ficou com ele. Aliás, não só uma...”. Era o que todas as garotas falavam. E os garotos lamentavam por terem sido amigo de “uma mocinha” por tanto tempo. E eu? Eu estava entre o coração e a razão, apesar de as duas dizerem que eu estava errado. Algo em mim queria vingança e, agora que eu havia feito, eu me sentia mal. O coração era o que mais gritava.
Então ele me procurou. Estava em lágrimas. Mas ele não me culpou. Ele disse que havia merecido tudo isso. Ele disse que me amava muito ainda. Disse que não guardava mágoas de mim. Disse também que a sua avó já sabia de tudo e que havia aceitado numa boa. Eu fiquei desarmado. Não era isso que eu esperava. Eu queria que ele sofresse, queria que ele se sentisse sozinho, como eu havia sentido. Eu queria que ele tivesse de chorar abraçado ao travesseiro, porque ninguém poderia acolhê-lo, entendê-lo, abraçá-lo.
- Quem sou eu pra você? O que eu significo na sua vida?
“É isso! Ele precisa de mim...”. Bastava apenas uma frase pra que ele se sentisse acolhido, pra que tudo isso acabasse. E bastava apenas uma palavra pra que ele se sentisse como eu havia me sentido, pra que sofresse tudo aquilo que eu havia sofrido.
Eu olhei em seus olhos e ele olhou nos meus. Eu estava indefeso. Ele viu tudo isso em meus olhos e então eu me lembrei daquela famosa frase: “os olhos são o espelho da alma”. Haviam sido. Os meus e os dele. Eu havia visto que ele não queria fazer aquilo que fez comigo. Mas ele não estava preparado. “Talvez tivesse de ser assim mesmo”. Eu, o garoto tímido, sentimental e romântico havia mostrado ser mais forte do que o garoto seguro de si, popular e desejado. Então, eu percebi que todo aquele ódio era um amor reprimido, um desejo incontrolável. Eu não queria vê-lo sofrer. Eu queria tê-lo pra mim. Eu queria que acontecesse isso que estava acontecendo. E meus olhos sabiam... Antes mesmo de eu dizer algo ele já estava sorrindo. Então eu o abracei. E lembrei-me de outra frase...
O coração tem razões que a própria razão desconhece.
O meu antigo eu não havia morrido. Havia apenas se aperfeiçoado.





19 de julho de 2012

Reviravoltas - Parte I




E então ele me pergunta:
- Quem sou eu pra você? O que eu significo na sua vida?
É o fim. Foi o que eu pensei. O fim pra mim, porque, para ele, era apenas o começo. O começo no qual ele sentiria tudo aquilo que eu já havia sentido, no qual ele sofreria tudo aquilo que eu já havia sofrido. Tão fácil livrá-lo de tudo isso. Mas bastava apenas uma palavra, “nada”, e ele seria humilhado e maltratado como eu havia sido.
Voltemos ao começo. Um idiota, romântico e sentimental e o objeto do seu sentimento. O cara desejado, seguro de si, bonito, elegante. Traduzindo: aquele que nunca vai te dar bola! Mas você o ama e o admira. Meio de longe. Afastado. No seu interior você sabe que não passa de um amor platônico, impossível de ser realizado. Foi o que eu pensei.
Um dia começo a olhá-lo, admirá-lo e meu olhar se perde. Ele percebe que está sendo observado, eu não. Quando dou por mim ele está sorrindo. Um sorriso perfeito. Com certeza é um sonho, mas não era. E então ele entra na minha vida. Começa a conversar comigo. E o idiota romântico e sentimental se torna a presa tímida e arredia. E talvez, por isso ser apenas um jogo, tenha durado tanto.
Boatos começam a correr. Na escola, começo a ser observado. Eles dão risadas quando passo. “Foi ele!”. Na sala ainda me olham, ainda dão risadas. Alguns nem sequer disfarçam. “O que será que ele andou falando?”. O pior é que não havíamos sequer nos beijado. Era apenas um jogo. E ele parecia que não estava a fim de desistir, pra ter colocado o jogo em risco dessa maneira. “Talvez não tenha sido ele”. Era a voz do meu coração. “Sim, não foi ele! Talvez seja a minha roupa. Talvez esteja rasgada ou algo assim...”. E eu sabia que não estava. Mas coração é assim... Tão forte que consegue acalmar a voz gritante da razão.
O sinal bate. Era a hora de saber o motivo da minha angústia. E, no corredor, fico sabendo. Ele está lá, com os seus amigos. Olha pra mim e sorri. Mas não é aquele sorriso. É um sorriso cínico, de deboche. E, sorrindo assim, ele caminha em minha direção. Os seus amigos o seguem, trazendo em seus rostos o mesmo sorriso cínico e malicioso.
- Olá mocinha!
Continuo calado, olhando em seus olhos, procurando por aquele olhar que, nos dias anteriores, havia me trazido tanta paz e conforto. Percebi que ele hesitava me olhar nos olhos, agora. O sorriso sumiu. Por alguns segundos. Fixou os olhos nos meus e então sorriu maliciosamente. “Ele não quer fazer isso”, razão e coração sabiam disso. “Mas ele não hesitará em fazer. Um garoto como ele não colocaria sua reputação em risco”.
- Eu disse olá para a mocinha. Ela não vai me responder?
Os amigos dele davam risadas estrondosas. Eu chorava por dentro, mas por fora eu continuava olhando fixamente para ele. Ele procurava não encarar o meu olhar. Olhava para os seus amigos, mostrava as mensagens em seu celular. “Eles descobriram e acuaram-no. Ele teve que fazer isso! Eu sou apenas o bode expiatório...”.
Eu me virei e continuei andando. Fui embora, escutando risadas e mais risadas até chegar ao portão. Nesse momento eu já não tinha mais coração. Esse foi um começo e um fim. Começo de um novo eu e o fim do antigo cara romântico e sentimental. 

*  *  *

Eu sofri. Foram tantos apelidos, tantos boatos. Os professores notavam que alguma coisa estava acontecendo. Minhas notas iam piorando, quase não prestava atenção nas aulas. Fui chamado na diretoria. O diretor perguntou o que estava acontecendo, se eu estava tendo algum problema em casa ou algo do tipo. Como podiam ser tão cínicos? Eles sabiam o que estavam acontecendo. Os professores ouviam os apelidos, as piadas. Muitas vezes riam delas, disfarçadamente, claro. E eu estava lá, na mesa do diretor, ele me perguntando se eu estava tendo algum problema. É óbvio que ele sabia. Aquele cara sentimental, tímido e resignado não diria nada. Mas aquele cara havia morrido. Olhei em seus olhos e disse:
- Tenho certeza que sabem o que vem acontecendo. E tenho certeza também que não vão fazer nada a respeito. Tudo que querem é que eu me foque mais nos estudos.
O diretor ficou um pouco surpreso. Com certeza não esperava uma resposta dessas do “garoto comportado”, que sempre tirava boas notas e respeitava professores e alunos. Mas eu havia ouvido conversas entre os professores. “Ah, você sabe como é a adolescência! Eles ficam tão confusos com tudo. Espero que ele tire isso da cabeça. É um menino tão bom!”. E por que eu não poderia ser um menino bom, mesmo gostando de quem eu gostava?  Não, eu não iria mudar apenas porque eles não aceitavam.
- As minhas notas vão melhorar, diretor. Não se preocupe com isso!
Ele afundou na poltrona, aliviado. Sorriu e disse que já podia ir pra minha sala de aula.
Esperei os boatos da “minha mocidade” sumirem. Fofocas eram o que menos faltavam naquela escola e, depois de uns três meses, eu fui esquecido. Zoar a mocinha da escola já não tinha mais graça porque eu não me importava. Sorria maliciosamente. Era o que eu precisava. Eu voltei a procurá-lo. Agora era preciso mais cuidado. Nada de mensagens no celular ou sorrisos disfarçados durante o intervalo. Saber da sua rotina ajudou com meu plano. Ao acabar a aula e depois de sair aprontando com os seus “amigos” populares ele ia sozinho pra casa. Segui-o. Sozinho, ele era muito mais bonito. Estava andando cabisbaixo, com fones de ouvido e observando as paisagens. Eu me aproximei. Aquela rua era deserta, assim não havia perigo de ninguém nos ver.
- Olá!


Continua...