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23 de dezembro de 2014

Insônia



Tudo está rodando. As minhas mãos tremem. A sensação não é tão ruim. Inebriante. Estimulante. Eu poderia continuar até a eternidade fazendo isso... Com você. Não com esse qualquer que faz estas caretas idiotas. Empurro a cadeira. Chuto a mesa. Pego as minhas roupas no chão. Abro a porta. Olhando para um ponto fixo na parede da sala, grito: “Sai daqui!”. Não tenho tempo pra explicações. Ou talvez isso tudo se passa na minha mente. Porque continuo lá, entre um orgasmo fingido ou desejado. Efêmero, em ambos os casos. Coloco a minha cueca e finjo escutar tudo o que o outro fala. Palavras, palavras, palavras. Como se eu me importasse. Como se algo realmente importasse.





“Que nome estranho!”. Vejo a foto dele no celular. Um chapéu na cabeça, moreno, um sorriso de tubarão na rosto. “Bonitinho”. “Você vai adorar ele, Gui!”.

Um beijo sufocante. Suas mãos percorriam e apertavam o meu corpo. Eu não resisti e comecei a percorrer todas as suas curvas. Detive-me nos botões da sua camisa e no zíper da sua calça, meus lábios sufocados nos seus. Um calor abrasador. E então...

"Você é vegano, né?". Olhei pra janela. O sol iluminava lá embaixo. Olhei pra ele e sorri. "Não, por que?". "Sei lá. Achei que você fosse". Sim, eu vegano e ele comprou lasanha quatro queijos. Sorri baixinho, lembrando da noite anterior e olhando o cara mais lindo do mundo cozinhando pra mim. 

Nós nos deitamos naquele chão frio. Exaustos. Eu me deitei em seu braço e ele me abraçou. Olhamos a janela. Por alguns minutos, o tempo para. A paixão nos preenche. Tudo o que importa é o calor dos seus braços.

“... E eu queria dizer que te amo”. Sorri, emocionado. O primeiro eu te amo. “O primeiro de muitos”, eu pensei. Guardei o meu celular e olhei para o infinito. A vida é mesmo muito boa. O sorriso insistia em continuar no meu rosto e eu não fazia nem um pouco de questão de tirá-lo.

 “Você aceita namorar comigo?”. Meu coração apertou, dentro do peito. Mesmo o seu hálito de álcool não quebrava a magia do momento. Mesmo a sua afirmação extremamente vergonhosa e constrangedora. Acho que eu balbuciei um ‘O quê?!?’. Eu me assustei, sem dúvidas. “Sim, eu aceito”. Você me abraça, na cama. Eu, o cabelo totalmente desarrumado e com a cara de quem acabou de acordar (literalmente) e você, bêbado, acabado, cara de quem acabou chegar de uma festa (literalmente).

“Esse está sendo um dos melhores carnavais”. Será? Porque o meu sim. Nós dois, aqui, sem ninguém. Eu, dentro dos seus braços. Dormindo e acordando com você. Passeando com você. Eu beijo você e dou um sorriso. “Tô com fome!”. Vou para a cozinha e, enquanto bebo água, olho fixamente para qualquer ponto e sorrio. A alegria não cabe dentro do peito. Como é bom amar!

“É sua!”. Eu seguro a minha respiração. Eu havia prometido que não usaria, mas aquela aliança era tão linda. Eu olhei pra ele e o abracei. Tudo tão perfeito. O melhor namorado do mundo.

“Nossa, essa mulher demorou demais!”. Meu coração a ponto de sair do peito. Finalmente. Meu namorado, conhecendo a minha família. Eu observo atentamente a reação da minha mãe. Ela sorri e o abraça. Minha vó, querida, amada. E, então, minha tia. “Finalmente!”. São amigos de infância. Tudo como em meus melhores sonhos. Esboço um sorriso de canto, talvez imperceptível. Talvez não.

“Eu sei que você quer que eu coloque a minha camisa azul”. Não queria assumir, mas realmente. Ele deixa a camisa desabotoada. Não falo nada. Mas ele está lindo. Esboço um grande sorriso. No final da noite, eu coloco a minha cabeça em seu ombro e escuto ele cantar Elis Regina. Todos felizes. Inclusive eu.

“Ele adora jogar na minha cara que eu não gosto dele, mas sabe como ele me pediu em namoro?”. Adoro ver a reação dos seus amigos quando falo isso. Eles sempre entram pro meu time. E com as duas não foi diferente. O moço não foi diferente. Mas eu gostava de ver como ele me abraçava, orgulhoso em dizer que eu era seu. Eu sempre me encolho naquele abraço e dou um sorriso. Este é o papel que eu nasci para interpretar.

“Me desculpa, amor. Eu fui um idiota. Me desculpa, por favor”. Foi só eu chegar em casa e vi a mensagem. Chorei muito. Mas o trajeto foi o suficiente para eu esquecer todas as mágoas. Eu gosto dele demais para ficar magoado por causa de uma briga. Claro que desculpo. Uma, duas, mil, um milhão de vezes. Ele me ama. E eu amo ele desesperadamente.

“Volta essa música, amor. É, essa mesmo!”. A música linda. Parece que eu já ouvi antes. Ela me lembra algum daqueles filmes da minha infância. Eu me deito em seus braços e ouvimos aquela música inteira, juntos. Eu não consigo deixar de sorrir. “É essa a nossa música, amor. Hymne a l’amour”.

“Espera só um minuto”. Vejo a rua, ao longe. Os carros passam. Risco o chão com o meu tênis. Será esta a nossa última vez. Treino o discurso que venho repetindo desde a última briga. Ele está com o casaco preto, sério. Lindo. E talvez, a partir de hoje não seja mais meu. Engulo as lágrimas. Vamos para a casa dele. No colchão, ele pergunta. Eu pergunto. E ele fala que é melhor não. Eu não quero que termine. Não quero. Não pode terminar assim. Ele olha pro chão. “Ok”. Eu o abraço. Ele me abraça. O seu abraço me sufoca. Minha boca procura a sua. Meu rosto procura o seu. Nossas mãos se unem. Sou dele novamente.

“Você tá dançando muitoooo!”. Ele está sorrindo, completamente bêbado. Nós dançamos loucamente. Saudades desses nossos beijos, nossos corpos entrelaçados e da falta de respiração que o tesão que eu sinto por ele me causa. “Tinha um cara olhando pra você”. Saudades desse ciúme besta. Eu não havia visto nenhum outro cara a festa inteira. Porque eu sou seu, meu bobo!

“Gui, eu já tô pronto”. Gui. Gui. Gui. O meu nome não sai da minha cabeça. Faz dois dias que ele não me chama de amor. Deve ser coisa da minha cabeça. Estou com a minha camisa branca, com o capuz cinza. Ah, ele não gosta dessa camisa. Coloco a minha camisa cinza, vermelha e preta. Desço o morro e ele está lá. Cara de cansado. Sem um sorriso. Trago a salada marroquina que a minha tia havia feito, junto com o presente dele. Ele vai adorar, tenho certeza. Ah, tenho que mostrar o vídeo da minha tia e da minha prima. Ele vai rir muito! Sorrio pra ele e ele me olha e esboça um sorriso ‘fake’. “Vamos almoçar. Preciso falar uma coisa com você depois”. Aconteceu algo. Eu me martirizo. O tempo não passa. Preciso saber o que é. Preciso desesperadamente saber o que é. E a hora chega. Ele só pode ter me traído. Não tem importância. O importante é a sinceridade. Eu o perdoo. “Eu quero um tempo”. Ele não me quer mais. Meu mundo caiu.




Exclui mais uma vez o Tinder. Hesitante, exclui também o Scruff. Por via das dúvidas é melhor excluir o Hornet também. Olho pra estante. Ele não a viu. No guarda-roupa, o seu chapéu. O chapéu branco. Da primeira foto. Sem querer derrubo a caixa. E, lá no fundo, a aliança. Tiro e observo.


Troco os dias pela noite. Olho no relógio. Três horas da manhã. Aumento a música. “You're gone and I got to stay high All the time to keep you off my mind High all the time to keep you off my mind Spend my days locked in a haze Tryin to forget you babe, I fall back down Got to stay high all my life to forget I'm missing you”.
14 de dezembro de 2014

Podre!



Podre.
A palavra reverbera,
Sonora, gritante
As mãos que deslizavam pelo seu corpo...
Podres!
Os dedos que pressionavam...
Podres!
Podres eram os sussurros das madrugadas,
Os contornos maliciosos,
Os olhares obscenos
E as incursões sorrateiras,
Tão complexas, pareciam troféus.

Era incontrolável o desejo,
Avassalador,
Abrasador,
O fogo queimava seus dedos
E o vazio...
Podre!
Demônio de si mesmo,
Escravo dos seus próprios ensejos,
Refém da sua falta de amor.
Sugava, então,
Qualquer beijo
De qualquer boca
A qualquer momento.

Mas, mais podre
Era sua falta e seu desespero
Por migalhas de sentimento.
Seu medo,
Podre, tão podre!
Que apodrecia tudo que ele tinha por dentro. 
13 de dezembro de 2014

Artur. Sem H.

Os finais de semana se arrastam com a lentidão de um século. Alterno entre criar uma história e contar o que realmente se passa. E por que não unir os dois? Mas, como eu ia dizendo, os finais de semana se arrastam. E o personagem que se arrasta na lentidão dos finais de semana poderia ser uma versão minha, incompleta de tão só, completa de potencialidades de tão amparado. Um nome diferente, afinal ninguém precisa saber das coisas loucas que se passam nas mentes estranhas dos dias vazios.

O nome do personagem é Artur. Assim mesmo, sem H. Sem h de homem, mas com h de hábito. Habituado era a alternar entre as mais diversas atividades. Ele acordava de manhã e, ainda na cama, pegava o seu computador. As notícias eram as mesmas. As mensagens continuavam inexistentes. O final de semana continuaria com o H de horrível. Ele se empolgava com alguma história interessante, alguma atividade que o preenchia por algumas horas. Almoçava. Saía, às vezes. Lia. Comia. Cantava. Dormia. Cochilava. Ligava. Mandava mensagem. Arrumava a casa. Passava roupa. Tirava o cadarço branco do tênis já lavado no meio da semana e colocava no lugar. Existência cruel.  

Talvez seja errado contrariar a realidade das coisas, ainda mais quando se estuda para ter introjetada a mentalidade do real como um espelho passível de reflexão. (Sim, jornalismo. Assim mesmo, com j minúsculo). Mas, com uma existência como a de Artur, será que não me permitem um pouco de licença poética? Pois bem. Artur era assim. Gostava dos finais de semanas completos. Repletos de atividade. Adorava trabalhar. O ócio é o que o matava. O tédio era seu maior suplício. Artur não era solitário. Não, não. Dizer tal coisa é um sacrilégio. Mas dizer que Artur tinha a companhia dos finais de semana é faltar com a verdade. Decidam-se vocês pelo pecado maior. Artur sofria da incompletude dos românticos. Ou do tédio dos que se acostumaram a ser por demais atarefados. Eu, como autor, prefiro a primeira opção, mas a segunda não é completamente falsa.

Sim, sim. Quanto drama, devem estar dizendo ou pensando. Como se o Artur já não o soubesse e, nos malditos finais de semana, se condenasse por sentir o que sente. E ele tentava. Não vamos condená-lo por falta de prática. Saía. Ia ao cinema. Passeava no bosque. Andava de ônibus. Saía com os seus amigos. E não sejamos exagerados. Nem todos finais de semana eram ruins. Havia os bons. Havia os ótimos. Havia os que ele queria congelar. Mas os ruins sempre se sobrepõem na memória.

Artur encontra um Lucas. Ou um André, um Carlos, um José, um Sebastião. Vazio como ele (nos finais de semana). Cheio como ele (nos dias úteis). Ansioso por compartilhar a inutilidade de uma companhia. Solitariamente solitário, amigavelmente repleto das melhores amizades. Talvez oposto por demais. Talvez parecido em excesso. Mas disposto. No final, não é esse o ingrediente mais importante?


Talvez tudo isso seja uma mentira. Talvez não. Talvez o Artur continue o mesmo, nos mesmos finais de semana. Mas ele segue. Bobo. Entediado. Empolgado. Com a esperança de encaixar o H certo do seu nome e tirar aquele outro sufocante H da sua vida. 
29 de novembro de 2014

Meus axiomas

A alegria de alguns sorrisos descabidos,
Nesse cabide, como é mesmo que chamam?
Normalidade!
O exagero destes gritos,
O excesso das duras verdades,
Desse chão duro em que pisam.
Como é mesmo o nome?
Realidade!
Pois que deixem-nos em nossas risadas escandalosas
Nós somos jovens,
Tão jovens.

Melódicos em nossas canções,
Somos tão tristes em nossa tristeza:
O exagero é nosso por direito,
Nossa maior qualidade,
Nosso mais notório defeito.
Um sexteto de instrumentos diversos
Mas de harmonia congênita:
Temos violas de cordas que se preocupam,
Tubos de um trombone que se anseia
E toca, nervoso,
Pelas teclas do piano que se alheia
E o violino, tão sensível,
Entrega as notas mais sofisticadas a toda e qualquer sereia.
A cantora dá risadas,
E o silêncio escuta, sereno, alheio, pequeno,
Entra e sai,
É intruso, mas também faz parte do concerto.

São plantas,
Sensíveis à temperatura,
Com galhos para todos os lados,
Mas de raízes profundas.
Vêm e vão,
Caem as folhas no inverno,
Mas se alegram na primavera
E a estação das flores sempre perdura.
Enroscam-se,
E uma planta a outra segura,
Mesmo pesadas, uma a outra não derruba.

Nestes estribilhos,
Nada foi aclarado,
Tudo, escurecido.
E já explico quem são,
E entenderá o motivo,
Tão óbvio quanto um axioma, meu caro,

São os meus melhores amigos! 



14 de novembro de 2014

Elementar, meu caro

Elementar, meu caro Watson. Elementar. Essa vida que passa voando e eu aqui, meu caro. Nós aqui. Nesse redemoinho sem emoções. Ou de emoções. Emoções fingidas, vendidas, compradas, revendidas, exportadas. Essa autossuficiência desenfreada. Esse não querer mais o bem querer. Então eu sou fraco, meu caro. Porque gente dependente de gente. Porque carente. Porque doente de amor. Porque independente dessa bolha de plástico de [in]diferença que nos afasta. Nessas vozes hipócritas que gritam por mudança. Gritam. Gritam. E se calam. Morrem, porque não agem. Afastam, porque só condenam. Nessas vozes infantis que gritam, esperneiam, berram, choramingam para que tudo continue igual. Elementar, meu caro. Esses rótulos de garrafa que foram jogados e espalhados. Distribuídos. Todos pegaram. Eu não quero mais, meu caro. Não sou obrigado. Não quero moldes, nem predefinições. Não quero destinos certos. Não quero certo e errado. Quero o incerto. Quero o meu completamente errado. Porque se errei é porque fui contra tudo o que dizem. Se errei eu fiz o que quis. Sofri. Dependi. Pequei. Fodi. Me fodi. Fui fodido. Proibido. Censurado. Mas fui eu. Acertei, no final. Sem certo, sem errado. E isso é elementar, meu caro. Elementar!


30 de agosto de 2014

Meias mentiras

Eu poderia dizer, nestas linhas tortuosas,
Que ainda sou seu.
Seu!
Corpo, alma, coração
Corpo das noites quentes e frias,
Alma do abraço de aconchego,
Coração da entrega sem medo.
Mentiria, porém, se o dissesse.
Em algum momento, eu me perdi de você,
Você se perdeu de mim,
Nós nos perdemos de nós mesmos

Eu poderia dizer, nestas estrofes desconexas,
Que eu o esqueci,
Que as lembranças foram fugazes,
Que os toques foram efêmeros
E que o amor era pequeno,
Foi pequeno.
Mentiria, porém, se o dissesse.
Meu corpo não lhe pertence,
Minha alma não é sua posse,
E, mesmo sem ser seu,
Meu coração se enternece com as lembranças
E não quer ter mágoa daquele que, por muito tempo, o aqueceu.

Eu poderia, e posso,
Dizer, porém,
Que no espelho
Eu me enxerguei
E hoje sei quem sou.
E não mentiria, não minto,
Ao dizer:

Foi maravilhoso amar e ser amado por você!


24 de agosto de 2014

Patologicamente lírico



Há coisas que só quem tem poesia na alma consegue entender. Alguma vez você já sentiu um tsunami, literalmente um tsunami, que o submerge e o afoga no mar de emoções? Você consegue sentir, claramente, a vida surgindo, com uma mão pesada, e o sacode, balança? Poesia não é apenas se emocionar. As emoções são naturais, afinal. Todo mundo sente. Tristeza. Alegria. Pena. Poesia é estar submerso nas emoções. Ser sacudido por elas. Sentir a emoção. Pensar a emoção. Transbordar a emoção. Ser poeta não é ser escritor. Há quem é poeta e não transforma em letras as suas emoções. Há quem transborde em cores. O vermelho da paixão ardente que consome o seu interior por baixo do amarelo do medo que aprisiona, dentro das formas abstratas de algo que não se sabe explicar. Poesia é não saber explicar. Há quem transborde em canção. A explosão de uma orquestra como a explosão da vida. Dentro de nós, nada é calmo. Tudo é explosivo.

Há quem escreve e não é poeta. Porque não explode. Porque não é sacudido pela vida. Porque nada afeta. Porque enxerga o mundo preto e branco. Ser poeta é ser um eterno incompreendido. O sentimento que transborda é parte. E a outra parte sempre está lá dentro. Você quer tirar tudo. Quer mostrar para o mundo aquilo que você sente. E as palavras não são suficientes. As cores não são boas o bastante. As canções não conseguem transmitir. E você insiste. E você sofre. E você mostra parte daquilo tudo.


Ser poeta é, por que não?, ser apaixonado. Estar apaixonado. Viver apaixonado. Apaixonar-se. Por uma ideia. Por um ideal. Por um trabalho. Pelas cores. Pelas letras. Pelo som. E, finalmente, por alguém. Ser poeta é ligar-se patologicamente a alguém. E pintar suas cores. Degustar o som da sua voz. Soletrar as letras do seu nome e sobrenome. Esculpir as formas do seu corpo. Gravar as diferentes expressões do seu rosto. Imitar os seus gestos. Acompanhar os seus passos na dança. Ser poeta é ser doente, estar doente e, talvez, permanecer doente. Porque, eis o nosso maior segredo, nunca conseguimos ser, estar e muito menos permanecer indiferentes. 
12 de agosto de 2014

Pressa de você

A saudade tem cheiro de Arbor,
Sorriso gigante,
Me chama de amor.
A saudade é apressada,
Ligeira, falante,
Hesitante, certeira.
A saudade tem gosto de pudim roubado,
Molho rosê compartilhado
E beijo molhado.
A saudade tem som de roda de samba,
Egocentrismo de criança
E amor, muito amor.
Amor que aperta minha mão e segura,
Abraço que sela a paz,
Amor dos cuidados que faz
Amor que eu sinto

Da saudade que você me traz. 


Longa estadia



Uma coisa não me entra na cabeça: que o amor deva ser uma entrada pela porta principal com uma saída rápida pela porta dos fundos assim que a casa começa a ficar bagunçada. Será mesmo masoquismo sentar no sofá da sala e esperar a poeira abaixar? Óbvio, tudo tem seus limites. Se o dono da casa quiser enfiar a poeira goela abaixo, não há cristão que aguente. Pior ainda se ele quiser que você limpe a casa dele. Mas acredito que o amor seja um pouco de suportar. Toda casa tem os seus tempos ruins: seja um inverno, onde nem mesmo a sua aconchegante lareira é capaz de esquentar; seja o verão chuvoso, onde nem mesmo as orações a São Pedro fazem com que a água pare de descer. Sair pela porta dos fundos nesses momentos é fácil. Mas há quem se esquece de que um abraço não acaba com o frio, mas com certeza o ameniza. E água, quando tem de sair, é melhor que saia no suave aconchego de uma intimidade bem construída. E intimidade não se constrói numa entrada de cinco minutos, com paciência apenas para o café. Intimidade surge quando a companhia se faz presente mesmo após a porta da sala emperrar, o forno do fogão estragar e o botijão perder o gás. E principalmente, quando o som do salão de festas não funcionar mais e o dono da casa descobrir que, nestes momentos, pode-se contar com o suave aconchego de uma conversa no sofá desgastado da sala de estar.


Sei lá, pode ser babaquice, pieguice, bobeira, romantismo barato, excesso de comédias românticas e projeções neuróticas. Pode ser coisa de outro século. Sei lá. Mas, para mim, amor é entrada na porta principal. A pré-entrada não importa. Pode ter sido uma conversa de bar, uma cantada sem graça no ponto de ônibus, uma cutucada no Facebook, um ‘sim’ no Tinder. Sem moralismos. O que importa é uma boa estadia na casa. Apaixonar-se pelos detalhes. Ser cativado pelas minúcias. E não se desmotivar com os contratempos. A janela, que levou tanto tempo para que você aprendesse a abrir do jeito certo. Os talheres, que foram sendo tirados da gaveta, um a um, e divididos. Os casacos, que ele tinha tanto ciúme de compartilhar, mas que se ajustaram tão bem a você. A cama, que parece cada dia mais macia. Os lençóis preferidos você já sabe de cor. Mas isso não significa que você não possa surpreender com novos. O tão temido sótão, que mostrou um surpreendente aconchego nos momentos necessários. Também lugar dos álbuns de recordação, museus sempre engraçados de serem remexidos. No final, o orgulho e a satisfação de saber que você ajudou e ajuda a abrir a janela, que não se importa nem um pouco em dividir os talheres, que ama os seus casacos, que se satisfaz plenamente com a cama e que respeita o sótão faz com que a vontade de sair pela porta dos fundos desapareça misteriosamente. Ou talvez nem tão misteriosamente assim.  
26 de julho de 2014

A dança da sereia

Eu a vi dançando e, instantaneamente, fiquei de pau duro. Ela rodava, girava, balançava os seus longos cabelos e rodopiava o seu vestido vermelho. Seu corpo tinha as curvas mais simétricas que eu já havia visto em minha vida. Sua bunda e seus seios empinados marcavam o seu vestido e enchiam os meus olhos. Eu babava, em cima e embaixo. Ela percebeu o meu olhar insistente e grudou os seus grandes olhos de jabuticaba nos meus. Sorriu maliciosamente. Segurou a sua saia e maneirou no vai e vem. Eu me senti constrangido. Um mulherão daqueles deixa qualquer macho de quatro. Ela sacou o meu constrangimento e parou de dançar. Como uma deusa, uma musa, aquela mulher maravilhosa se aproximou. Passo a passo. Seu corpo remexia, suas coxas quebrando num vai e vem gostoso, os seios, que seios!, balançando suavemente. Eu imaginei aquela mulher na minha cama e me lembrei do meu “parceiro”, animadinho demais na minha calça. Tentei disfarçar. Ela se aproximou e me puxou pelas mãos. Eu dançar? Ela estava louca. Mas mais louco estava eu por ela. Mesmo sem jeito eu topei. Ela colou seu corpo ao meu e, naquele momento, acho que tive um orgasmo. Fui ao céu e voltei. Ela sabia que estava me deixando completamente maluco. Ela pegou as minhas mãos e as colocou na sua cintura. Começou a rebolar. Loucamente. Lentamente. Deliciosamente. Seus olhos de jabuticaba estavam colados aos meus. Sua boca, contornada por um provocante batom vermelho, esboçava um sorriso de satisfação. Ela sacou o meu desajeito e maneirou na condução. Eu comecei a requebrar. Segui seus passos. Girei. Rodopiei. Rodopiamos. Giramos. Eu a beijei. Ela me beijou. Nós nos beijamos. Loucamente. Lentamente. Deliciosamente. Passeei por todo o seu corpo com as minhas mãos nessa dança louca e então eu descobri...

Eu dançava, linda e rica. Leve e solta. Femininamente livre. Rodava, girava, balançava os meus cabelos e rodopiava com meu vestido vermelho preferido. Estava cansada dos olhares dúbios e das risadas mal disfarçadas. Todos me olhavam, mas nenhum me interessava. Até eu vê-lo. Seus olhos seguiam o meu rodopiar com ávido interesse. Mal conseguia esconder o seu tesão. O volume em sua calça se destacava. Os seus lindos olhos verdes contrastavam com a sua pose de babão. Sorri. Segurei a minha saia e maneirei no vai e vem. Um bofe daqueles, alto, sarado, barba a fazer e olhos verdes? Não há mulher que se aguente! Ele estava visivelmente constrangido. Hesitei. Parei. Seus olhos me chamavam. Seus braços fortes, o seu grande peitoral e o maravilhoso abdômen definido marcavam a sua camisa branca e as suas pernas grossas aumentavam o volume, que volume!, em sua calça. Eu me imaginei em cima daquele homem, tendo-o somente para mim. Caminhei vagarosamente e os seus lindos olhos verdes acompanhavam cada movimento meu. Eu o puxei pelas mãos e colei seu corpo ao meu. Senti todo o “impacto” e tive múltiplos orgasmos. Fui ao céu e voltei. Ele estava louco por mim e eu louca por ele. Peguei as suas mãos e as coloquei em minha cintura, com uma grande esperança de que ele se comportasse bem e não estragasse aquela noite, colocando-as onde não devia. Eu comecei a rebolar. Loucamente. Lentamente. Deliciosamente. Seus olhos verdes estavam colados aos meus. Seu rosto ainda estava com a mesma expressão de satisfação misturada à perplexidade. Ele estava desajeitado. Eu maneirei na condução. Ele me surpreendeu requebrando. Seguiu meus passos. Girou. Rodopiou. Rodopiamos. Giramos. Ele me beijou. Eu o beijei. Nós nos beijamos. Loucamente. Lentamente. Deliciosamente. Mas, ele resolveu passear em meu corpo com as mãos e então ele descobriu...

... Um volume em seu vestido! Aquela mulher maravilhosa era um homem. Percebi que todos me olhavam. Todos já sabiam! Seus olhos de jabuticaba me olhavam com ternura e receio. Seu corpo desfez o laço que, minutos antes, me deixou louco. Ela se virou. E eu escutava a música ao fundo. E eu percebia os olhares mal disfarçados e as risadas de canto de boca. E eu continuava hipnotizado pela sua bunda, que, apesar dos pesares, insistia em rebolar dentro daquele vestido vermelho. Cada passo que ela dava, parecia que a minha perna sucumbia de agonia. O meu corpo queria o seu. Ela sacou a minha indecisão e estacionou. Involuntariamente, dei um passo. E a música ao fundo. E os olhares mal disfarçados e as bocas paradas: um clima geral de apreensão. E a minha contínua hipnose por seu corpo rebolativo. Perdi as esperanças de um final racional. Voluntariamente, a minha mão pegou a dela. A sua mão. A mão da minha mulher maravilhosa. E a música ao fundo. Ela apertou a minha mão e rodopiou de volta para os meus braços. Eu a apertei. Todo o meu corpo tremia de excitação e ansiedade. Nós nos encaixávamos perfeitamente. E, surpreso, percebi minha perna rodando. Girando. Rodopiando. E ela me seguiu, a minha deusa dos olhos de jabuticaba e dos longos cabelos negros. Girando. Rodopiando. Sendo guiada pelos meus passos, já não mais inseguros. Dançamos. Loucamente. Lentamente. Deliciosamente. Apaixonadamente. E a música ao fundo. E os olhares escancarados e as bocas escandalosamente abertas de espanto. Sorrimos como dois doidos. Ela colocou a mão onde eu desejava e eu não me importei nenhum pouco em colocar a minha onde não devia.


Em meus pensamentos



Em minhas razões,
Meu amor se confunde com meu desejo
E meu corpo se confunde, une e exausta o seu.
Minha boca tem sede da sua,
E a minha pele, nua, tem saudade do calor da sua pele desnuda.
Meu amor é puro?
Eu me pergunto
E, por segundos, duvido.
Então me lembro do horizonte do seu sorriso,
O aconchego do seu olhar
E silencio as minhas dúvidas.

Em meus sonhos,
Antigos sonhos,
O amor seria uma calmaria,
Um barco ao relento,
Lento, mas não parado.
Meus pré-conceitos...

Pois em minhas expectativas,
O amor é doação,
Partilha
E compartilhar a tensão,
Tesão,
Pulsão,
Calmaria de sensações.

Em meu presente,
Vivo aquilo que acredito
E me regozijo.
Em minhas lembranças,
O amor tem um cheiro adocicado de noites silenciosas,
Deitado por sobre seus braços,
Tempo pausado,
Deleite prolongado:
Amor, pra mim, é você.







11 de março de 2014

L'amour de primaveras

Uma linda poesia escrita por uma pessoa muito especial para mim...

L'amour de primaveras
                                                                                                                  Juber Pacífico



É manhã de primavera, as flores anunciam sua chegada
O abraço apertado é a libertação da saudade prisioneira
Sorrisos largos chegam em forma de êxtase
O toque brutesco confessa a ansiedade de ti

O olhar inocente e ao mesmo tempo fervoroso
observa os mais sutis movimentos do corpo
e não se contenta com um beijo
o corpo quer mais, quer sentir-se sem fim

O seu jeito encantador, que de tão magnífico hipnotiza a alma
e o calafrio confirma o medo de te ver caminhar ao norte
mesmo sabendo que essa vida não é o suficiente para nós

L'amour chegou, ficou e não quer partir
Se prendeu, encantou, refletiu
Se perdeu, inventou, resistiu.
26 de fevereiro de 2014

Insônia de amor



3 da matina
Os sons da madrugada me agitam
E o turbilhão de sensações me domina
Você me deixou ir
A saudade me embriagou
E a ressaca de amor me entorpeceu

Por dentro de toda a confusão
Somente o vazio...

Fraco, confesso!
Nem sequer lutei
A Lua e as estrelas são testemunhas da minha solidão voluntária
Você me deixou ir
Eu não fiz nada,
Não gritei uma palavra,
Não ameacei nenhum tapa.
Simplesmente segui!

Por dentro de toda a confusão
Somente o vazio...

Noite adentro,
Cheio de desejos,
Encharcado do marasmo,
Entupido de monotonia,
Preso em uma rotina acíclica e vazia.
Sonho com o reencontro,
O abraço,
O aconchego.
Ah, encolher-me-ei em seus braços,
Afogar-me-ei em seus beijos
E todo o vazio será mera lembrança,
E todo o marasmo, abominável nostalgia
E a insônia
Será insônia de amor!


17 de fevereiro de 2014

Estranha liberdade

Estou estranhamente livre
Fora da prisão que eu mesmo construí
E fiz fortaleza
Estou estranhamente feliz
Estranhamente voando,
Pairando,
Estranho
E alheio a tudo que senti
Quero que esse momento se prolongue infinitamente
Essa paz interior
Essa leveza
Essa estranha liberdade.