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12 de janeiro de 2012

Singularidades



Às vezes fico aqui filosofando nos meus momentos de solidão ou mesmo nos momentos de tédio juvenil. Ser adolescente é foda! Toda aquela coisa de hormônios, compromissos, relacionamentos faz com que a vida dê uma volta de 360 graus. Mas tem coisas que só conseguimos avaliar melhor com a idade, seja ela adolescência, fase adulta ou velhice. E uma dessas coisas é compreender a nossa singularidade, a nossa diferença que muitas vezes é tida como defeito.

Dizem que é na adolescência que começamos a criar os nossos próprios valores, querido diário, e eu concordo inteiramente! E, sabe, eu fico muito impressionado e também muito magoado com certas coisas que eu vejo por aqui, por ali, acolá. Mulher se humilhando por causa de homem, apanhando, perdendo a sua dignidade. Fico tão triste, principalmente quando isso acontece com pessoas que são especiais para mim. Admiro as mulheres pela sua força e pelo seu brilho, algo que não é só bom de admirar, uma coisa boa de sentir também! E, por isso mesmo, quero que elas sejam tratadas com respeito e que o exijam, que o procurem.

Situações de desrespeito e de humilhação também vivem os nossos amigos negros. É um preconceito velado, uma coisa meio disfarçada, mas que uma hora ou outra acaba sendo verbalizada. E eu fico tão irado, querido diário! E isso sem contar o que devem passar os índios. Lembro do caso de um deles que foi queimado. Sinceramente, não acho que raça ou sexo faça alguém ser superior ao outro.

Pior então o que passam os meus amigos homossexuais ou os que fogem do padrão da heterossexualidade. São humilhados por aqueles os quais nos falam que são os nossos únicos amigos: os pais. Alguns ameaçam botar o filho pra fora de casa, outros colocam mesmo. Alguns fazem o filho passar por situações constrangedoras para que ele “vire macho”. Acredite se quiser, querido diário, mas já tive um amigo que foi obrigado pelo pai a assistir filmes pornográficos. Também há mães que acham que os filhos estão com algum espírito maligno e levam-no para sessões de descarrego. E acabam todos meio que acuados, sabe. Sem ter para onde ir, sem ter alguém para abraçar e dizer “não se preocupe, está tudo bem. Nós te aceitamos do jeitinho que você é”. É triste, mas é a realidade.

E, me diz querido diário, o que seria de um mundo sem diferenças? O que seria de um mundo condenado à mesmice, à padronização. Como seria um mundo igual? É o que eu fico imaginando às vezes.

Imagine, querido diário, um mundo onde todos fossem iguais. Um mundo onde todos pensassem igual, vestissem as mesmas roupas e se interessassem pelos mesmos assuntos. Um mundo onde orassem para um mesmo Deus, onde não existissem raças, pois a cor de pele seria igual para todos. Um mundo sem sexo, sem gênero, sem “opção sexual”. Um mundo com os mesmos gostos e pensamentos.

Vamos imaginar, querido diário, que nesse mundo todos acreditem em astrologia. Mas acho que a astrologia não seria algo muito lucrativo, pois todos iriam se interessar e pesquisar sobre a mesma. Não seriam necessárias consultas astrológicas. Todos teriam um livro de astrologia em sua casa e leriam seus horóscopos no começo do dia. E todos teriam as mesmas previsões, os mesmos signos, os mesmos planetas nas mesmas casas astrais. E ninguém seria Aquário, o Revolucionário. Ninguém seria Virgem, o Perfeccionista. Talvez todos fossem Piscianos Sonhadores, acreditando em misticismo e em destino, mesmo sendo esse o mesmo para todos.

Imaginemos que nesse mundo todos se amassem e nele o amor perderia toda a sua beleza, pois todos teriam os mesmos pensamentos, as mesmas ações, as mesmas crenças e religiões, a mesma cor de pele... E o mesmo sexo! Seriam todos homossexuais. E nesse mundo a homossexualidade não seria um desvio do padrão. Seria a normalidade. Seria, então, uma norma? E se fosse como se chamaria? “Homonormatividade”?

Porém assim como num mundo onde só existissem mulheres, ou somente homens, apesar dos homossexuais terem de ser algum dos dois, nesse mundo não existiria reprodução. Esse mundo seria um mundo fadado a destruição. E com todo mundo pensando igual, ninguém iria ter a ideia extraordinária da criação de clones. Ou alguma outra ideia, ideia essa que nunca iria nascer em um mundo padronizado.

Um mundo, quem sabe, onde todos não acreditassem em Deus. E, consequentemente, nesse mundo Deus não existiria. E Deus não conseguiria fazer milagres nem aparições para convencer as pessoas de sua existência já que as pessoas não iriam mudar, iriam continuar nas mesmas ideias sempre e sempre em função de sua igualdade. E o pôr-do-sol seria explicado por alguma teoria científica, ou melhor, não seria explicado. Em um mundo onde não há originalidade e oposição, não há avanço e Ciência é avanço, é tecnologia. Acho até que nesses mundos que acabei criando as pessoas não pensariam. Porque pensar é se destacar entre a multidão através da mente e essas pessoas não se destacam. Todas pensam igual, fazem igual. São máquinas humanas que nunca vão entender o porquê de sua existência ou suas funções.

E nesse mundo não seriam necessários cremes diferenciados para cabelos oleosos ou para cabelos secos e danificados. Todos teriam o mesmo tipo de cabelo e usariam o mesmo creme, o mesmo xampu, o mesmo condicionador. Não seriam necessárias cotas para pessoas negras e nem passeatas pela criação de uma lei contra a homofobia. As paralisações pela igualdade dos salários seriam mitos e as favelas, nas quais as pessoas acabam não tendo oportunidades, seriam histórias pra boi dormir. Nesse mundo todos teriam oportunidades, sempre as mesmas e acabariam as executando da mesma forma. Um mundo fadado a mesmice e à eternidade monótona. Um lugar onde ninguém se destacaria e a diferença fosse uma palavra que ninguém conseguisse entender. Um lugar onde não existiriam classe A, classe B e classe C. A palavra pobreza não existiria no dicionário, e muito menos a palavra riqueza. Não seriam necessárias rampas para deficientes físicos, legendas para deficientes auditivos e cães para guiar os deficientes visuais.

Chato, muito chato esse mundo! E é pensando nele que eu vou chegando à conclusão de que o NOSSO mundo ainda tem jeito. O nosso mundo é perfeito, com todas as suas imperfeições, com todas as suas diferenças. Aqui deixo claro que sou a favor da diferença e não da desigualdade. Sou a favor dos diferentes pensamentos, das diferentes doutrinas, das diferentes ciências e a liberdade de expressão para falar de todas elas. Sou a favor do homem e sou a favor da mulher, da união, paz e igualdade entre eles. E, se o amor assim mandar, o homem amar o outro homem, a mulher amar a outra mulher ou quem quiser. Sou contra todas as barreiras impostas ao amor em suas diferentes formas. Sou eu o escravo negro lutador, o índio amante das florestas, os europeus visitantes e também o português invasor, destruidor e construtor dessa nação meio às avessas. Por que e pra que me ater a uma só raça? Por que e pra que julgar o diferente, se ninguém é igual a ninguém?

Quando eu morrer, querido diário, quero ser lembrado como alguém que lutou contra os padrões e preconceitos. Alguém que teve amigos de todas as raças, que amou e respeitou homens e mulheres, que teve amigos com sexualidade das mais comuns até as mais exóticas. Quero ser lembrado como alguém que foi diferente porque ser igual não tá com nada! 

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